terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Porto Alegre em Cena - Postagem 01


Os Persas – 04.09.2008





Clássico de Ésquilo, Os Persas, escrito em 472 a.C, é a mais antiga tragédia da literatura mundial transmitida oralmente e esteve em cartaz no Teatro São Pedro com o Deutsches Theater sob direção de Dimiter Gotscheff

Fui assistir a montagem de Os Persas, tragédia grega de Ésquilo, escrita há 2.500 anos, sendo o texto teatral mais antigo que se tem notícia. Montagem da Deutsches Theater Berlim, uma releitura de “Os Persas” com olhar de hoje. Poderia se pensar se não há nada mais atual para vir da Alemanha para apresentar no nosso Festival. Bom resolveu-se apostar nessa leitura modernizada do clássico na visão do diretor Dimiter Gotscheff, algo arriscado por ser uma encenação aberta que nos oferece leituras confusas. A barreira da legenda para quem não entende a língua alemã, não seria problema como já tivemos diversas peças legendadas em outras línguas, não fosse o espetáculo uma montagem baseado no texto, no seu jogo de palavras e no seu entendimento. E nisso torno-se maçante assistir a história depois de vinte minutos do prólogo do Corifeu, numa linguagem mantida no verso grego, e que lendo e tendo que acompanhar ficou difícil.O interessante depois de um tempo olhando para cima (legendas) e para baixo (encenação) foi abstrair um pouco a legenda e olhar como os textos eram ditos, prestar atenção nas atuações (pois já haviam se esboçados os personagens e suas idéias) e tentar pegar a atmosfera das cenas.Vamos a história:
Com base em fatos contemporâneos do autor, e não em histórias mitológicas, Os Persas, traduzido por Heiner Müller, decorre em 480 a.C quando o exército persa perde a Batalha de Salamina para os gregos, que os mantiveram sob seu domínio por longo tempo.
Nesta obra, o escritor grego Ésquilo não exalta a vitória, mas analisa a batalha pelo lado da derrota dos persas e apresenta responsáveis pelo fiasco, inclusive Xerxes, comandante e rei vencido. A propósito, Ésquilo participou da Batalha da Salamina como soldado.
Na encenação do Deutsches Theater, uma parede divide o palco exatamente ao meio. Dois homens com roupas de executivo - cada um de um lado, a parede entre os dois – surgem das profundezas e gargalham em grande e perfeita harmonia. Um deles reclina-se um pouco e a parede desloca-se alguns centímetros para dentro do território do outro. Ambos riem deste pequeno deslize, dão as costas e logo a parede é recolocada em seu lugar. E assim, a harmonia é quebrada: será que agora a parede está realmente no meio?Esse ate então nos apresenta uma encenação que pensamos vai apostar no bom humor para contar toda a história, e demostra ser uma cena muito interessante calcada em dois atores que aproveitam muito bem o jogo que estabelecem. Mas logo entre o Corifeu que anuncia toda a tragédia, e vemos que o diretor pareceu querer trabalhar na cena anterior dos dois homens lutando pelo seu espaço com uma leveza de apresentação da história ou melhor da idéia da divisão dos povos. E ao evoluir o texto nos apresenta toda a trama, e nos leva a entender o que foi a Batalha,quem são os generais, soldados e demais envolvidos nessa história. Como falei, tornou-se uma real aula de história, contada de modo a levar a ação falada a ter uma importância maior na peça. Nenhum outro elemento se sobresai a não ser a entonação dos atores e suas mínimas interpretações, alias ponto para os interpretes pois pequenas e sutis variações eram notadas nas partituras corporais dos personagens que me faziam crer em suas angústias. Os atores Samuel Finzi e Wolfram Koch empenham-se muito bem e são os destaques das atuações e da encenação como um todo, dando vida, o primeiro a um mensageiro e depois ao Rei Xerxes, que condiziu os exércitos persas a derrota, e no monólogo final quando ele retorna a Pérsia há um momento de grande domínio da presença de palco pelo ator. E Wolfram, que além de também fazer um mensageiro, interprete o general Dário, que morto e invocado pelos súditos, e ao se levantar do tumulo, interpreta piedosamente a catástrofe. Sua dicção e postura corporal da a dimensão mínima com força necessária para detonar sua piedade por aquele povo a quem subjugou quando vivo.Aqui temos elementos místicos, não muitos recorrentes na tragédia, que versa sobre assuntos históricos.Mas se nas peças míticas se infiltram esses conteúdos históricos em Os Persas a história se mostra miticizada.
Voltando ainda para o início da peça, onde dois homens, disputam seu espaço e controle sobre ele, pode se estabelecer algumas conexões com fatos da vida moderna, com uma associação com os Estados Unidos, com o Iraque, das divisões e guerras da Europa, de Israel, do Irã. Afinal, cada um é responsável por seu próprio espaço. Mas pode-se dizer que Os Persas, dirigido por Dimiter Gotscheff, oferece todos os estímulos para a formação de sinapses.Pena que a quantidade de texto que era dito, aliado ao fato de a maioria do publico ter que ler as legendas, e não tendo muita ação física, tornou a encenação tediosa e cansativa após as falas iniciais da Rainha Atossa (bela força dramática da atriz Almut Zilcher). Nem tanto a barreira da língua,pois isto já tiramos de letra em outros espetáculos, mas a encenação de um texto baseado apenas na palavra dita, e em se tratando de um clássico da tragédia, é um obstáculo para muitas platéias mundo afora.O bom e que nos sul-americamos tomamos contato com um formato muito crescente de se montar teatro na Europa, privilegiando a fala do que a ação física (mais interna, mas presente) e tendo um elemento do cenário significativo como aqui.

Avaliação: ☺☺☺

SOBRE A PEÇA

A peça fazia parte da tetralogia composta pelas tragédias Fineu, Os Persas, Glauco de Potnies e pelo drama satírico Prometeu, o acendedor do fogo, sendo Os Persas a única destas que permaneceu completa. Os Persas é a mais antiga peça de teatro de que se conhece o texto completo. A trama circunda o comportamento dos persas, sobretudo dos nobres persas, de Xerxes, o rei derrotado perante sua mãe, Atossa, e o fantasma do pai, Dario.

SOBRE A BATALHA DE SALAMINA

A batalha de Salamina foi o combate entre a frota persa, liderada por Xerxes, e a grega, comandada por Temístocles. O enfrentamento deu-se no estreito que separa Salamina da Ática, no mês de setembro de 480 a.C e terminou com a vitória grega. A batalha aconteceu após as vitórias persas na Tessália e em Termópilas, devastação da Beócia e da Ática. O rei persa Xerxes entrou em Atenas, destruindo inclusive os monumentos da Acrópole, desenvolvendo aquela que ficou conhecida pela Segunda Guerra Médica.Enquanto os coríntios e os espartanos defendiam uma aglomeração militar no istmo, Temístocles concentrou a frota de 200 embarcações na baía de Salamina, enfrentando a frota persa, que, apesar do seu maior número, tinha dificuldades evidentes de maneabilidade no espaço exíguo do estreito, pelo que foi completamente derrotada pelos gregos. Xerxes foi obrigado a regressar à Ásia, deixando o comando das tropas restantes ao seu lugar-tenente Mardónio, que seria derrotado em 479 a.C na Batalha de Platea e Micala, nas costas da Ásia Menor.Diante da necessidade de organizar a defesa e de equipar o exército, Atenas liderou a formação da Confederação de Delos, uma aliança entre várias cidades-estados gregas que deveriam contribuir com navios ou dinheiro nos gastos da guerra.

SOBRE O DEUTSCHES THEATER

Situado no meio do centro histórico de Berlim, o Deutsches Theater é considerado por muitos o mais bonito teatro da cidade. Desde a sua fundação em 1883, o DT fez história.
Otto Brahm lançou autores como Gerhart Hauptmann, August Strindberg e Arthur Schnitzler. Sob a direção de Max Reinhardt a partir de 1905, o DT foi considerado o “olimpo do teatro” por suas cativantes encenações clássicas.Heinz Hilpert trouxe à casa um programa clásssico-humanístico durante a ditadura nazista. Em 1989 os atores da DT envolveram-se nos protestos que levaram à queda do Muro de Berlim. Após a direção de Thomas Langhoff nos anos 90 e Thomas Ostermeier na DT-Baracke, Bernd Wilms assumiu como novo diretor. Sob sua direção, a casa tornou-se novamente um dos melhores palcos do país. Principalmente quando os quatro diretores permanentes Barbara Frey, Dimiter Gotscheff, Jürgen Gosch e Michael Thalheimer imprimiram seu estilo.Em 2004 o DT foi apontado como Teatro do Ano. As produções Quem tem medo de Virginia Wolf?, de Edward Albee (direção: Jürgen Gosch), Orestes, de Ésquilo (direção: Michael Thalheimer), Tio Vânia, de Anton Tchecov (direção: Jürgen Gosch) e Os ratos, de Gerhart Hauptmann (direção: Michael Thalheimer) foram convidados para o Theatertreffen de Berlim, que apresenta as melhores produções do ano em língua alemã. Membros da companhia como Nina Hoss e Ulrich Matthes foram premiados pelas suas atuações. Prêmio internacionais foram dados a montagens convidadas como Emilia Galotti, de Gotthold Ephraim Lessing (direção: Michael Thalheimer), e Lolita (direção: Oliver Reese).Hoje, o Deutsches Theater da Schumannstrasse acomoda três palcos: o Grosse Haus com cerca de 600 lugares em uma sala de atmosfera intimista de 1850, o Kammerspiele com cerca de 230 lugares, e o recém inaugurado Box – uma caixa preta compacta no foyer do Kammerspiele com 80 lugares para novos textos e temais atuais. No Deutsches Theater, são encenadas cada vez mais peças clássicas – entre elas Fausto (parte 1 e 2), de Goethe, Dom Carlos, de Schiller, Emilia Galotti e Minna von Barnhelm, de Lessing, Sonhos de uma noite de verão, de Shakespeare, Orestes e Os persas, de Ésquilo, assim como Medéia, de Eurípides. O palco Kammerspiele é dedicado principalmente a dramas modernos e contemporâneos – entre eles, Longa jornada noite adentro, de Eugene O’Neill, O jardim zoológico de cristal, de Tennessee Williams, Sono, de Jon Fosse, Im Schlitten Arthur Schopenhauers, de Yasmina Reza, e Sobre animais, de Elfriede Jelinek.O DT também está presente internacionalmente com mais de 200 apresentações desde 2001, vistas por mais de dez mil pessoas. Produções como Emilia Galotti, Fausto I, Fausto II, Quem tem medo de Virginia Wolf? e Os persas foram apresentadas na Europa, América do Sul, Estados Unidos e Japão.

SOBRE DIMITER GOTSCHEFF

Nascido na Bulgária, Dimiter Gotscheff foi para Berlim Oriental no início dos anos 60 para estudar e acabou se envolvendo com o teatro. Tornou-se aluno e colega de Benno Besson, primeiramente no teatro alemão e depois no Volksbühne am Rosa-Luxemburg-Platz. Sua primeira encenação foi “Die Weiberkomödie” de Heiner Muller, em Nordhausen. Em 1979 Gotscheff deixou a Alemanha Oriental e voltou para a Bulgária. Desde a metade dos anos 80, trabalha em diversos palcos de idioma alemão, de Viena a Hamburgo.
Suas produções podem ser vistas regularmente no Berliner Theatertreffen. Entre elas, A luta do negro e dos cães ,de Bernard-Marie Koltès, Ivanov, de Anton Tschechow (produções do Volksbühne am Rosa-Luxemburg-Platz), assim como Tartufo, de Molière (produção do Festival de Teatro de Salzburg e do Thalia Theaters Hamburg).
Suas peças foram indicadas diversas vezes pela crítica especializada como“Peça teatral do Ano” e com Ivanov obteve o prêmio 3Sat no Theatertreffen 2006. No Deutschen Theater, Dimiter Gotscheff trabalha desde 2006/2007 como diretor permanente.Antes de Os Persas, encenou A morte de um Caixeiro Viajante, de Arthur Miller,. Fragmentos, a partir de textos de Heiner Müller, Histórias da Floresta Vienense, de Ödön von Horváths, e Volpone, de Ben Jonson. A peça Os Persas foi aclamada pela imprensa como um das encenações de excelência do ano pela revista Tagesspiegel.


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